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Editorial: uma análise responsável sobre o trabalho análogo à escravidão

Um dos maiores desafios da sociedade moderna é lutar cada vez mais por sustentabilidade, em todas as cadeias produtivas rurais e/ou industriais. Na cafeicultura não é diferente. O mercado consumidor é cada vez mais exigente quanto às normas de produção, que tornam o café uma bebida de muita qualidade. Mas, não é apenas o sabor que está no radar dos compradores. A gestão ambiental e a responsabilidade social também estão em foco.

Rotineiramente, a produção cafeeira é acusada de ser uma cultura em que se encontra trabalhadores em condições análogas à escravidão. No entanto, é fundamental entender como funciona o processo de enquadramento de uma relação trabalhista como trabalho escravo.

O Ministério do Trabalho e Previdência (MTP) destaca que “considera-se trabalho realizado em condição análoga à de escravo a que resulte das seguintes situações, quer em conjunto, quer isoladamente: a submissão de trabalhador a trabalhos forçados; a submissão de trabalhador a jornada exaustiva; a sujeição de trabalhador a condições degradantes de trabalho; a restrição da locomoção do trabalhador, seja em razão de dívida contraída, seja por meio do cerceamento do uso de qualquer meio de transporte por parte do trabalhador, ou por qualquer outro meio com o fim de retê-lo no local de trabalho; a vigilância ostensiva no local de trabalho por parte do empregador ou seu preposto, com o fim de retê-lo no local de trabalho; a posse de documentos ou objetos pessoais do trabalhador, por parte do empregador ou seu preposto, com o fim de retê-lo no local de trabalho”.

Para o Conselho Nacional do Café (CNC) há necessidade da criação de regras mais claras sobre o que é trabalho análogo à escravidão. Há informações de que propriedades são inspecionadas e enquadradas na lista suja porque estavam com um trabalhador temporário sem registro, o que aconteceu por pedido do próprio funcionário para não perder o seu enquadramento no Programa Auxílio Brasil.

Esta ação levou o CNC a apresentar dois pedidos para o MTP, sendo um em 04 de junho de 2020 para o então Ministro Luiz Eduardo Baptista Pereira e o outro em 10 de novembro de 2021 para o Ministro à época, Onyx Lorenzoni, através dos ofícios 0144/06/2020 (CNC) e 0948/11/2021 (CNC). Os dois documentos continham o mesmo objetivo: propor que fosse editada uma resolução ou portaria em que o trabalhador receberia ajuda governamental e ao ter a sua Carteira de Trabalho assinada pelo empregador – por ser um trabalho temporário – não perderia o Auxílio Brasil. Esperávamos que houvesse a compreensão governamental porque o benefício era somente para trabalhadores já cadastrados nos programas do Governo Federal.

No entanto, até agora, nenhuma medida foi adotada, o que leva o produtor ao constrangimento, pois ele tem que optar em aceitar o trabalhador sem registro na carteira ou deixar de colher o café, visto não ter mão-de-obra disponível. Julgamos correta a definição do MTP, destacando no parágrafo terceiro deste editorial e, ainda, acrescentamos que o trabalhador necessita de alojamentos limpos, água potável, transporte seguro, entre outros. Mas, o registro em carteira, não causa nenhuma insegurança ou comprometimento à saúde e bem estar do trabalhador.    

Acusação infundada

Recentemente, um artigo publicado por uma agência de notícias atacou empresas multinacionais que compram café de cooperativas que têm como associados, fazendas acusadas de trabalho escravo. Somos a favor da fiscalização, desde que seja feita com bom senso. Acusar uma multinacional ou culpar uma cooperativa pelo suposto erro de um único produtor é injusto. Num universo de 330 mil produtores, 20 fazendas não podem ser utilizadas para generalizar toda uma cadeia como apoiadora do trabalho escravo ou acusa-la de conivente com ele. É óbvio que não podemos aceitar a escravidão em pleno século XXI, mas usar uma mínima parcela em prejuízo à cafeicultura brasileira é injusto.

Outro ponto a se destacar é o fato de as cooperativas agirem rapidamente quando uma propriedade está sob investigação. De forma geral, os cooperados são suspensos e só voltam a figurar como fornecedores de café à cooperativa a qual estão ligados, após comprovarem que não utilizam de mão-de-obra análoga à escravidão. Do contrário, se condenados, suas cotas são excluídas pela cooperativa.   

Orientação constante

O CNC, junto com suas cooperativas e associações vinculadas levam informações permanentes para os produtores não incorrerem no erro de promover qualquer ação que possa ser considerada escravidão ou trabalho infantil. No ano de 2020, reforçou algumas recomendações de proteção ao trabalhador safrista destacando os principais tópicos da cartilha ´Orientações sobre prevenção ao coronavírus durante a colheita do café´, expedida pelo CNC, em parceria com a Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural do Estado de Minas Gerais (Emater/MG). Acessar a cartilha (clique aqui) 

Na última semana, o Conselho foi parceiro do MTP na divulgação de evento on-line da Subsecretaria de Inspeção do Trabalho (SIT) que apresentou informações fundamentais para cafeicultores e trabalhadores rurais para a ano Safra de 2022.

Certificações

Acusada pelo mesmo artigo citado anteriormente de ser frágil no monitoramento dos aspectos trabalhistas nas lavouras, a cadeia cafeeira vive constantes processos avaliativos, com visitas de auditores das certificadoras, visto que o café brasileiro exportado não sai do país sem ser certificado. Um dos itens mais rígidos na avaliação dos compradores é a questão trabalhista. A exigência da sustentabilidade na cafeicultura brasileira não é apenas uma bandeira. Ela é buscada diariamente pelas cooperativas, associações e pela esmagadora maioria dos produtores, sendo um dos mais interessados de que seu café alcance os padrões de qualidade exigidos, conseguindo assim, melhor precificação dos seus produtos.

Os trabalhadores rurais merecem o máximo de respeito possível. Eles são fundamentais nas lavouras cafeeiras, pois desenvolvem funções que nenhum maquinário consegue realizar. O que as reportagens muitas vezes esquecem de avaliar é o número de empregos que a cafeicultura promove. A cadeia gera 8,4 milhões de empregos diretos e indiretos, estando presente em 1.983 municípios de 16 estados produtores, sendo 78% de pequenos cafeicultores. Não é possível dizer que essa é uma cultura prejudicial para a nação, muito pelo contrário. Os excessos e erros devem ser apurados e punidos, mas desde que seja de maneira justificada.   

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